11.10.06

Segunda-Feira

O dia estava muito frio. Perdoaria quem nesse dia pulasse o banho e fosse direto ao trabalho, mas não sei se seria perdoado. O tempo era tão frio e a água tão quente, que mal a cheguei sentir, caía como centenas de curtas beliscadas num corpo que não era meu. Nem as pernas, estalagmites do concreto e do azulejo, eu sentia.
Acabado o banho enxuguei a cabeça, escolhi uma das combinações que faço sem criatividade entre a calça e a camisa e desci as escadas para a cozinha ampla onde o frio parecia habitar com mais vigor, talvez por tanto tempo vazia...os cachorros presos do lado de fora, latindo ainda sem muita vontade. Antes de acender a luz uma esperança residual da infância viu minha mãe atrapalhada entre pães e leites, chamando-me pelo diminutivo. Ela não estava lá. A lâmpada acendeu preguiçosa, segundos depois de eu já ter apertado o botão. Oscilou indecisa, apagou, voltou a piscar até encontrar-se numa estabilidade triste e amarela...meu sol de segunda-feira.

2.10.06

Caderno

Escrevo aqui no caderno o que queria que eu fosse. Quando acaba o assunto e nada vejo de interessante é quando nem fantasiando eu sou, quando estendo a fatídica condição de senhor grisalho até meus mais altos devaneios e nada resta além de, na tristeza desse constato, escrever sobre isso.

Guardo-me com o passar do elástico nas abas desse pequeno confessionário, e na gaveta ou bolso do jaleco fico descansando da vida que levo, meu corpo oco das coisas que no caderno deixei escritas, sempre.