10.7.07

Noite de Domingo

A noite é um monstro enorme, negro com a mandíbula distendida para abocanhar o mundo. Sua língua, extensões de cimento úmido, abraça já a todos e desemboca aqui, na frente de casa. Afasto de leve o pano da cortina. Pela frincha se vê os dois halos incandescentes, dois postes no fim da rua fazendo tilintar a viscosidade suja da manta de água ante a escuridão de uma infinidade de lâmpadas apagadas. Ele olha pra mim. Uma goteira incessante e irregular tira minha atenção, um segundo, sim, sete segundos, não. Como fosse muito velho ou criancinha, algo não me deixa largar o tecido por completo. Seguro com as pontas dos dedos uma das extremidades da cortina e checo mais algumas vezes a presença eterna da noite de domingo, aqueles olhos esbugalhados que me deixam muito triste, aquela desolação inefável para a qual telefonema e abraços não são de nenhuma utilidade.

Estão lá, ainda. A ponta da língua serpenteando meu bairro, enrolando-me como presa passiva e convencendo-me vencido.