26.5.09

Embebedado

Gal Costa



Pendurado de banda
No vão da varanda
Do prédio a rodar,

Não sei mais se é o mundo
Que cai aos meus pés
Ou de pernas pro ar;

Embebedado de você,
Tonto na beirada da

Tentação de cair e voar,
Até me aninhar em você,

Mal parado num muro
Sem prumo, em que estudo
Onde me equilibrar,

Entre o chão e o barraco
De estrelas que cai
No que foi nosso lar,

Abandonado por você,
Louco querendo mamar
Do segredo da vida e gritar
Até me agarrar em você,

Arrastado por dentro
Ao meu próprio espetáculo
Em tal patamar

Pela mão da sereia,
Que vai se tornando
A sirene a soar,

Convidado de luxo
A deixar a ribalta de amar

Pela escada de incêndio e baixar
Até me assistir escapar você,

Muito embora indo embora,
Eu mesmo mentindo
Devo argumentar:

Sou a sobra do efeito
Cascata da vodca
E desse luar.

13.5.09

Coadjuvante e Protagonista

O mundo tem coadjuvante e protagonista. O primeiro, em grande maioria, não percebe quando perde todas as chances de ser o segundo. Acontece que existe alguma coisa, uma reação química que faz com que os coadjuvantes, ao verem-se sem senhuma expectativa de de conseguir papel maior, não se joguem pela janela ou larguem-se perenemente aos efeitos degenerativos de uma vida drogada, nômade e internacional.

Quando isso acontece, sem saber exatamente o por quê, eles casam. Eles começam a pensar em fralda, porque a quantidade de pequenos afazeres é inversamente proporcional à investgação das coisas que realmente importam. E se fralda for pouco, se ele trabalhar em uma empresa que vende fraldas e que dá benefícios ao funcionário, ele pega um empréstimo, ele viaja para a Europa com o limite do cartão novo, que vence quinze dias depois do antigo, e se concentra em lembrar e falar da viagem semanalmente para que as brigas com a mulher nos seis próximos meses de aperto não sejam em vão.

Os protagonistas arriscam. Eles fizeram sempre o que gostavam, porque é só assim que se faz algo realmente bem, e passaram anos em uma situação que para os outros era arriscadíssima, porque tudo o que gostamos tem muita pouca chance de ser rentável. Alguns poucos tornaram-se os protagonistas de hoje, referências que mais se aproximam do que é ser feliz, outros muitos são o pior tipo de coadjuvantes.

Um “quase protagonista” assiste a tragetória de antigos colegas agora bem sucedidos, e as comenta em restaurantes como se a amizade em cidades cinzas cosmopolitas fosse algo que resistisse ao tempo. Muitos, também vítimas de outra reação química, tornam-se vorazes leitores de auto-ajuda e usam frases de “quase protagonistas” que eles mesmo salvaram para justificar que sua “quase felicidade” é opcional. E inspirados nelas também sentem-se confiantes ao ligar para os antigos colegas protagonistas, pedir ajuda da maneira mais nebulosa possível e receber, com sorte, um salário que deixará a esperança mais honrosa.

O que tem em comum é o fato de estarem todos letárgicos, presos a uma conformidade absorta raramente interrompida por reflexões. Todas inócuas contra a competição declarada que todos travamos hipócritamente, todos os dias.

Ou eu talvez tenha um dispositivo binário onde as coisas só podem ser uma coisa ou outra e minhas preocupações sejam sintomas de uma crise pela qual as pessoas da minha idade passam quando lêem sobre moleques que hoje são ricos criando coisas e outros que logo serão milionários as vendendo. Eu ainda não escolhi meu lado. Eu não me apaixono por nada.

12.5.09

Mais Formigas que Cigarras


Se possuidor de coisas que gosta e for de seu intuito preservá-las e a elas agregar outras, é mister ignorá-las, mesmo que propositadamente.

A satifação deteriora o que com dinheiro se conseguiu comprar.

Por isso nunca param de estudar (administração, engenharia), de se relacionar da forma mais política com quem lhe for de interesse, pois aproveitar as tardes amenas do sítio e preservar amizades despretenciosas parece não ser monetariamente confortável.

Foque. Pense apenas no próximo sofá e no mais novo aliado que seu dinheiro irá conquistar, mas sabendo que seu legado não será a casa de campo e sim a responsabilidade de mantê-la, o medo de perdê-la, enfim.

Melhor fossem todos autores de um bom livro lucrativo. Assim poderiam encarar suas posses como mero acidente, e usufruí-las com a leveza de quem delas não precisa.

Mas isso é impossível, não é? Para o mundo ter graça, sempre haverá mais formigas que cigarras.

24/5/2005

7.5.09

E se...

E caso fosse amor, o que nós saberíamos? Temos mesmo tudo diferente um do outro. Então do que vale fazer ressonante essa retórica inflamada onde todos tem razão?

E se for amor? Caso você seja a mulher mais linda que eu já vi. O engano nos invade na mesma proporção da vontade de se apaixonar. Se o trânsito chegou ao seu limite e minhas preocupações são muitas, eu não sei. Eu não sei se amo você. Eu quero te ver, quero ouvir música com você. Quero reclamar da minha vida parada, de todos esses segundos recorrentes.

Talvez te procurar acesso via internet. Quero o desafio de sempre te ter distante e de repente te abraçar. Não sei quanto tempo você namorou. Seus olhos são diferentes para mim, seus olhos são o foco da minha câmera, que flutua enfadonha meio ao bando de babacas.