31.8.05

A Poesia

A poesia nasce espetada pra fora. Sinto isso, como um cordão de sunga empurrado pela agulha, uma coisa que irrita se não sair. A agulha, na poesia, um estado profuso de sentir ou várias doses etílicas.

A poesia usa de alguns sinônimos, usa entre verbos pomposos substantivos muito simples, e torna-se serena. Orgulha o autor os segundos nos quais o leitor faz uma pausa, fecha o livro entre o dedo na página marcada, e olha por instantes o andar corriqueiro das pessoas.

A poesia de amor costuma usar o diminutivo, quando entregue totalmente à emoção, mas fica também muito bonita honesta, ponderando entre os prós e contras.

A poesia fala da vida também, muitas vezes da sua pouca importância, e nessas horas imagino o humilde autor debruçado na varanda de uma casa de campo, cuja a altura mal lhe quebraria as pernas caso tomasse coragem e pulasse. Degustando do gelado da brisa na noite quente, da lentidão das folhas das árvores, todas emaranhas pelo álcool transitante no sangue e pensamento.

Essa poesia, ponta de vida, testamento, carta de suicídio, irá então ser lapidada pelo mesmo artista, dia seguinte, porém com a lupa de quem sabe que aquilo foi apenas uma espetada mais chata e urgente, entre esfregões carinhosos na cabeça dos filhos.

Equilibra-se então seu conteúdo, e a pergunta egoísta de antes estende-se a outras vidas e momentos. Troca-se “mulher” por “pessoa”, “eu acho” por “dizem”, e sublima-se a linguagem universal adornada pela assinatura rabiscada.

Pessoas poderão recitá-la no Natal, crianças se alegrarão ao entende-la em parte e logo dirão que gostam, dirão que é isso que querem ser quando crescerem: poetas, escritores.

Quando realmente forem grandes, porém, descobrirão o velho livro na gaveta de sua mesa no escritório, na mesma página, e pensarão que talvez seja tarde. Tarde demais para confessarem-se espectadores da vida, além de vivê-la, o que é inevitável e simples.

Uma dessas crianças crescidas, surpresa pela constatação, se permitirá meia hora de descanso na praça durante o almoço, quando avistará ao longe o poeta pagando a conta de luz.

(Thiago Cunha)

1 comment:

Anonymous said...

oi.
leitura dinânmica.
nunca me irritei com o cordão da minha sunga, mas tenho um comentário relevante.
what is it with the chinese vases guy? ha ha ha
perco o amigo mas nao perco a piada.